Favela Orgânica

Tudo que sobra é aproveitado neste projeto que combate o desperdício

Logo que cheguei no Rio de Janeiro fui trabalhar como empregada doméstica. Minha patroa me pedia para ir à feira fazer compras e eu lembro de ficar horrorizada com a quantidade de alimentos que iam para o lixo no final do dia, amontoados de cascas, talos e folhas”, conta Regina, que sempre amou cozinhar. Além das compras da patroa, ao ver tanta comida espalhada no chão, ela não tinha dúvida: recolhia algumas coisas do chão e levava para sua casa. Lá, improvisava receitas como o arroz de talos e cascas, pão de mel de casca de banana e quiche de talo de brócolis e repolho, composições que foi aperfeiçoando ao longo do tempo. Autoditada, a paraibana, que cresceu assistindo seus pais aproveitando os alimentos na cozinha, passou anos, literalmente, cozinhando a ideia de fazer algo a mais com esse dom de transformar alimentos. “Um dia quis tirar esse projeto do papel, juntei algumas mães da comunidade, fizemos uma vaquinha de R$140 e realizei a minha primeira oficina. E não parei mais!”, relembra a cozinheira.


Daí por diante, as receitas só se multiplicavam – hoje são mais de 300! –, seus conhecimentos se aprofundavam e seu trabalho era cada vez mais admirado e reconhecido. “Minha missão é dar vida ao alimento que as pessoas estão acostumadas a ignorar e jogar fora, fazendo releituras de receitas e introduzindo esses elementos no nosso dia a dia”, conta Regina, que ressalta, ainda, o rico valor nutricional que cascas e talos reúnem. Com frequência, ela toma a Assossiação de Moradores de sua comunidade e ensina suas receitas impensadas, como o risoto de casca de melancia e o brigadeiro de casca de banana.

O que não pode ser reutilizado vira adubo, graças ao processo de compostagem, que Regina também ensina e incentiva na comunidade. Além disso, a cozinheira fala com propriedade de oficinas como a de consumo e desperdício, ciclo do alimento e hortas caseiras, as quais tem se empenhado a todo vapor nos últimos meses. O sucesso de sua inventidade e do apelo sustentável que seu projeto carrega, uma iniciativa cheia de verdade, levaram Regina até ao exterior, para o projeto Slow Food, na Itália, que conjuga o prazer da alimentação com consciência e responsabilidade. “Virei famosa por lá, todo mundo queria tirar foto comigo!”, brinca a paraibana.

Segundo Regina, a grande importância do projeto é poder transformar o olhar e o sabor das pessoas, fazendo uma boa ação para a natureza, para o bolso, para a saúde, para a rua e para o mundo. “Tem gente que implica, mas assim que prova se encanta e quer comer a bandeja inteira!”, conta. “Fora que a cozinha é o ambiente da troca, e  hoje em dia acho que estamos perdendo isso. Nas oficinas a gente reata a vontade de cozinhar junto, aproximando as pessoas…é um clima ótimo, de muita gargalhada. A cozinha do Favela Orgânica é mágica: posso estar estressada, quando entro para dar uma oficina, meu dia muda. É sensação indescritível ver o sorriso das pessoas redescobrindo os alimentos. É muito amor!”, conta Regina, com os olhos brilhando. “Juntei minha experiência com a vontade de ser uma cozinheira diferente. E, sinceramente, esperava essa repercussão toda, afinal, tudo o que é feito com amor e para o bem de todos, dá certo”, finaliza, orgulhosa.

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